quinta-feira, 23 de maio de 2024

A metafísica do impossível

Quando nos obrigamos a aceitar  que os fatos são inamovíveis, estamos submetendo-nos. Por que devemos crer que o mundo opera de maneira a provar a sua existência como superior à nossa vontade? Em última instância, por mais que não queiramos, estamos reconhecendo que, nesse império do mundo, existem coisas impossíveis, que regulam a nossa capacidade de transformação da realidade a nosso favor. Por pensarmos na fatalidade inerente, sob a constatação inequívoca da nossa falta de poder, entendemos que as coisas impossíveis constituem uma organização do mundo, uma metafísica. O trauma, a dor, a tragédia, o amor fati: como conceitos, ainda que a posteriori, retratam a inexistência de uma especulação metafísica em aberto. Só há a metafísica do fato, um império. O realismo nietzscheano e existencialista, ou ateu, mesmo que se diga afirmador da vida, entende uma existência metafísica do real: o possível e o impossível. Ora, mas não seria a plasticidade do mundo infinita? Para os dessa corrente, parece que não. Sem nem perceber, defendemos -- nós, reles mortais, e eles, grandes filósofos -- a existência de um romantismo realista (e há que se querer o contrário!): é uma explicação irracionalizável que sustenta a superioridade do fato, seja pela alegação da experiência do trágico, seja pela sua argumentação intersubjetiva indizível, incomprovável -- desesperada; pois não se trata aqui de comprovar, mas, talvez, no máximo, de demonstrar: em pasmo -- mostro-lhes minhas cartas, e vocês me mostram as suas. E me digam: se não é isto um fato? Talvez essa seja a primeira metafísica irracional, por isso tenha sido também chamada de filosofia da vida. Por quê, mesmo, se ela afirma a morte, assim, como um fato?... Os alemães não conseguiram explicar muito bem.

Nenhum comentário: