quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

mas não esqueça que veio do ódio

a imagem do mundo agora...
ah, não sei!
pouca coisa mudou, na verdade
mas o choque dos corpos, que a gravidade obriga, parece menos raivoso
agora eu sei o que realmente tem raiva...
uma cadeira de balanço sobre o chão
talvez explique a falta de "não" no meu sentimento com a imagem que vejo do mundo
(puramente as coisas, não o que posso enxergar ou imaginar delas com o tempo)
ela imóvel
e seu único ponto encostado ao chão

-

acho que andei foi me exercitando muito
pra vencer
por ódio
trabalhei resistência e não me importo mais com gravidade nenhuma,
nem com desaforos (muito menos com eles)
eles não têm peso mesmo
são sons de macacos
e se agora dizem: isso, isso, isso e aquilo
eu digo: tá, tá, tá bom, eu já sei o que importa

quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

Tunico é mau

O problema do Tunico começava em que ele fingia muito gostar das coisas, das pessoas, e, por trás, expunha a verdade de todos os seus gostos. Seu ressentimento saía nas suas babas empolgadíssimas de quando ele encontrava os seus verdadeiros seus, aqueles que provavelmente eram tão burgueses mas não tão deslumbrados assim. É difícil ser burguês e não ter nicho burguês - mais difícil ainda é encontrar algum burguês no Rio que não esteja nessa onda alternativa feliz de um ufanismo escamoteado. Tunico não gostava de nenhuma bandinha que começava a surgir, conhecia algumas delas, era amigo de alguns integrantes, mas tinham tantas e tão ruinzinhas que eram como os bares caretinhas da nova lapa da copa e da olimpíada: pretensiosas e ordinárias. Palavra de Tunico.

Aconteceu foi de Tunico ter ido num show de uma bandinha de uns amigos seus. E acontecia desses seus amigos, assim como Tunico, terem um sonho tão latente quanto infantil de se tornarem grandes artistas pensadores do seu tempo, como se ainda houvesse chance para qualquer juventude ter razão e fama como outrora. O nó era que ninguém fazia o devido esforço, o correto esforço - ninguém estudava muito, ninguém refletia muito, eram românticos dandys da zona sul, pessimistas ou otimistas -- e festeiros... e queriam fama por falarem de coisas que pensavam de primeira. Muita besteira, rima forçada e palavra difícil. Tunico era igualzinho, só não tinha uma banda, e isso o fazia sentir-se um passo atrás na corrida. Tunico também não era DJ, nem dava festas, o que devia agradecer a seu pai, por por-lhe no eixo; e todas essas coisas que ele não tinha, acumuladas, lhe faziam repugnar imensamente toda essa nova onda empolgada que as taxas de crescimento econômico do governo Lula refletiam na esperança desses jovens (pseudo ou proto?)-artistas. Tunico temia fortemente que fossem proto e ele ainda nada.

Tunico estava com tanta raiva que tudo lhe parecia uma grande piada. Viu o show do amigo, como manda o figurino, e saiu, despedindo-se, rapidamente, mas com toda a banca, como se nada tivesse de errado. Sua inveja era tanta que as melhorias na Lapa, os arcos pintados, as ruas fechadas para carros, as fachadas reformadas, o brilho do Rio pré-olimpíada... ah! tudo era uma grande mentira que contavam pros brasileiros e que os cariocas compravam rindo! Burros! Onde já se viu? Um povo mestiço. E as bandas eram de brancos da Zona Sul. As festas também, e quando não eram, a Gávea se coçava inteira quando estava lá - o Leblon nem à Lapa vai. A Lapa tinha sido tomada! Ou tentavam. Tunico, Tunico... O show, nos olhos aguçadíssimos de Tunico, não estava cheio, não tinha representatividade além de Botafogo - e o que era a Lapa, para esses dandys, senão uma extensão da boemia nova das escolas novas burguesas, cujos filhos fundaram o novo Botafogo? Sua mente, em rompantes pecaminosos-culpados, maldizia seus amiguinhos e repetia que a Lapa tinha sido roubada, rou-ba-da, que a malandragem não existia, não existia mais, que a arte estava sendo imposta naquele bairro tão cheio de passado heróico do Rio de Janeiro... Tunico só conseguia ver Madame Satã se revirar no túmulo com a pintura dos arcos e aquele bando de PMs.

O Circo e a Fundição eram ocupação estrangeira por lá, de causar inveja a qualquer catador de lata que, apesar de tudo, se aproveitava das latas. "Pobre catador de latas" infelizmente não era o que ele pensava, embora quisesse muito ter tal nível de compaixão naquele momento, para que pudesse xingar esses artistinhas seus amigos com o coração limpo, filiado a um ideal melhor. Ah, era tanta inveja que coçava Tunico - não se sabia do catador, se sentia o mesmo - e ele não podia se dar ao luxo de bradar o socialismo para o Brasil - seu pai era tão socialista e tão frustrado (e tão invejoso!) que o seu ego acabava falando mais alto, mesmo quando sem argumentos racionais e com muita paixão invejosa: socialista não! Mas e então, como se resolve a inveja na modernidade sem socialismo? E se entregava ao prazer que começava a sentir em desdenhar, diminuir, ridicularizar o sonho musical artístico revolucionário inovador moderninho dos seus amigos - e também o seu! Tunico começava a sentir um prazer imenso em ser mau.

quarta-feira, 5 de janeiro de 2011

hipocrisia

depois de mais uma noite reflexiva, um cigarro na porta da boate, antes de ir embora, e eu ignoro que possam me julgar mal.

inveja

Quando o que se tem em mente é o Óbvio Ululante fica difícil conviver docemente numa night. Odeio cruzar constantemente olhares e me sentir um stalker.