domingo, 30 de setembro de 2007

Achas realmente válido?

Queria, mais que tudo, saber qual o valor do questionamento, se devemos ou não incitar a dúvida, se devemos dar valor às nossas incertezas, se devemos nos apoiar em algo que se compõe de negação. Penso, então, em como sempre foi desenvolvida o conceito de Verdade. Nos foi possível estabelecer o que é verdade quando nos foi possível negar o que nos era tátil. Vimos a morte, e entendemos nela a total negação da vida. Vimos então a possibilidade do não. Passamos a negar o não mais veementemente que tudo, criamos religiões, crenças, até a ciência se encarregou de negar a negação. Acreditamos que por negarmos o negativo, como que matematicamente, alcançaríamos o sim. Doce ilusão. Apenas negamos o que já era negativo, tornamo-lo duas vezes falso. Mas aquilo nos fazia sentido, aquilo nos era verdadeiro, fora aquilo que nos trouxe a metafísica, a linguagem, a arte. E aquilo que gerou tudo o que somos. E é aquilo que se entende por Verdade. Verdade então é tudo aquilo que negamos duas vezes. É tudo aquilo que cremos ser certo para não nos frustrarmos com o que vemos, que já nos mostra ser real. Verdade é mistificar, é teorizar, é concluir quando só nos é possível observar. Verdade é cogitar, é possibilidade. Verdade, além de tudo, é crer que aquilo que se nega é verdadeiro. E, crendo que é verdadeiro, sustenta-se a verdade como total; damos valor a nossa perspectiva. E aquilo só será uma possível verdade, se for válido, ou seja, de valor aceitável para o fim que propõe ter para todos, para o público. Verdade e Valor caminham mais juntos do que a Santíssima Trindade.

soluções, o mais velho novo produto

Solução para tudo na vida: dionisiar tudo o que se entende como apolíneo, ou seja, tornar prazeroso aquilo que se diz racional, ou seja, não distinguir obrigação de esbórnia, ou seja, não distinguir trabalho de casa, ou seja, relaxar pensando e relaxar pensando.

Quando se é aprisionado pelo “ter que”, a vida segue o rumo das incertezas, das dúvidas, da negação ao que se fez e ao que se tem feito. Procure liberar endorfina em seu ambiente de trabalho. Quem sabe até compre aquelas músicas toscas de mantras e sons de cachoeira. Aromatize o ambiente com cheirinho de liberarei-endorfina-sem-esforço-só-respirando-e- agora-meus-problemas-acabaram-porque-comprei-esse-produtinho-mágico-no-mundo-verde. Mantenha seus níveis hormonais elevados, basicamente isso.

quinta-feira, 27 de setembro de 2007

O valor do valor

Ai, o nada! Poucos crêem no quão nada somos para universo, para o tempo, para nossas escolhas, para a formação de nós mesmos, para o controle de nossas ações. Antes que pudéssemos existir, existiam elementos, que, graças à existência deles – e somente por isso –, deram origem a novos elementos. E depois a mais elementos, até que surgiu o Universo, e as estrelas e as galáxias, e o Sol e todo o seu sistema, e nela a Terra, e em seguida transformações não pararam de acontecer na Terra, que deram condições para a existência de muitas outras coisas, inclusive nós, humanos. O que quero evidenciar é a dependência obrigatória que esses elementos todos têm entre si: um pertence ao outro e só poderia existir se o elemento que lhe possibilitou origem existisse primeiro, dando, assim, condição para que alguma coisa surja e, a partir disso, o elemento que propiciou a criação passa a ser uma condicionante para o criado.

Porém, a simples condição de existir, de qualquer coisa que seja, define também como aquilo pode existir, e tudo o que aquilo pode ser naquelas condições, que podem mudar acabar com o aquilo ou transformá-lo em algum outro aquilo. E nós, humanos, pudemos surgir dessa mesma maneira, era-se alguma outra coisa e agora, por transformações do condicionante, tornamo-nos humanos, seres que julgam escolher suas metas, modificar a ordem das coisas, imprimir valor naquilo que faz e naquilo que optou ser. Mas é tudo bobagem! Desde que nascemos já somos reféns das condicionantes, que vão me mostrar e participar de todos os nossos caminhos. Todas as nossas escolhas são fruto de pensamentos de um ser que só foi possível existir graças às condicionantes, que determinam todos os fatos que vão ser de nosso alcance o controle de seu desenrolar. O mundo condiciona as decisões que tomamos quando é ele que define que fatos nós vamos passar por desde o momento em que nascemos. E só temos a noção de que poderíamos nascer ou ser em outras situações quando nos é possível ver que não escolhemos o que somos nem o que fazemos. Então, imaginamos situações hipotéticas de acontecimentos e, às vezes, as tentamos botar em prática e, se as botarmos, será uma ilusão de que fazemos o que queremos. Teremos feito o que as condicionantes nos fizeram pensar em fazer, pois pensamos através de experiências.

Ao vermos nossa não escolha perante nós, percebemos inconscientemente o nosso não-valor, e o não-valor de tudo, e passamos a imprimir valores naquilo que participamos. O homem é impressão de valor.

segunda-feira, 24 de setembro de 2007

Saindo para a diversão

Estava lá, sentada, minhas amigas tinham ido dançar, estavam no pique extraordinário do ébrio, perguntaram-me se não queria ir com elas, já tínhamos fumado alguns rets, bebido um pouco, era hora de dançar, de rir, de sorrir, não de pensar. E eu pensava. Pensava na solidão que eu sentia. Sentia por não querer estar lá, dançando com as meninas, nem me pegando com alguém, nem em casa sozinha em frente ao computador. Saí para ficar sozinha, pensando nos outros que eu via naquela boate, pensando em mim vendo os outros. Mas não me sentia realmente sozinha, senti que meu sentimento de solidão era falso, que não podia me sentir só, que injustiça, eu tinha família, mãe, pai, irmãos, tinha comida, meu pai pagava minha faculdade, tinha amigas – que estavam comigo há 2 minutos atrás –, tinha meu drink na mão, assim como meu cigarro, já tinha tido namorado, tinha a companhia dos meus livros, da música, até da sociedade, que me beneficiava por eu ser classe-média alta. Eu era realmente muito egoísta por me sentir sozinha, mas era assim como me sentia. Me sentia à parte de tudo, das minhas amigas, das pessoas que dançavam freneticamente na boate, dos meus quase-amigos com quem eu não tinha assunto e estavam ali do outro lado do sofá sentados enfileirados olhando para frente, fumando um solitariamente uns com os outros. Eles pareciam todos muito sozinhos, como eu, à parte de tudo, pensando cada um em seu mundo, em sua vida, sem conversar, sem dançar, somente olhando para frente e rolando e tragando o beck. Foi quando um deles viu que eu olhava e me chamou:

- Ei, Cela, senta aqui com a gente!

Não sei se queria sentar ao lado deles, já estava muito chapada e iriam me oferecer o ret para me integrarem e eu já estava mega-chapada e não queria conversar com eles e não teria o que conversar com eles e:

- Não obrigada – rejeitei o baseado e continuei ali, ao lado de quem me ofereceu, como um deles que não conversavam, sozinhos, olhando para frente, pensando sobre qualquer coisa, inclusive sobre a situação pela qual eu passava.

Me sentia agora ilegitimamente sozinha. Ao lado de outros sozinhos não era solidão. Mas ao mesmo tempo era uma puta de uma solidão. Não era amiga desses sozinhos, não era não-amiga deles. Era a única que estava sozinha naquela situação, entre eles. E pensava em algo realmente sozinho, a solidão. E como que imperceptivelmente, fui chegando um pouco para o lado, nada que fizesse com que percebessem minha distância, mas queria que fisicamente eu me sentisse distante deles, sozinhamente sozinha. De repente:

- Oi, gatinha, ta sozinha aí por quê? Esperando o príncipe encantado? Se for isso, cheguei! Qual seu nome? Me dá um beijo?

-Sai daqui! – desvencilhei-me dele gloriosamente e fui me direcionando para a pista, encontrar as meninas, e fui pensando que realmente estava sozinha e nada exterior poderia modificar isso, só constatar mais. “Ta sozinha por quê?” ecoava na minha mente. Mesmo estando ao lado de alguém, de pseudo-amigos, de sozinhos em grupo, eu estava sozinha e o mundo podia ver isso e agora eu chegava perto das meninas, ia contar o que aconteceu faticamente. Deixaria o subjetivismo solitário sozinho e mudaria de humor, contaria a elas o quão engraçado foi e ia ficar sozinha, no meu grupo de sozinhos, com quem eu poderia pensar sozinha sobre a solidão e humoradamente vivenciaria a wannabe cool noitada que prometia fatos engraçados e pensamentos sós.

domingo, 23 de setembro de 2007

Dançando Medievalmente

Pista de dança, quando cheia, o que menos me parece é que ela tenha sido feita para dançar – parece mais a Europa Ocidental durante a Idade Média. São vários povos, muito próximos uns aos outros, uns menores outros piores, com suas características culturais próprias e sempre excluindo culturas externas e por isso com vontade de espaço, para dançar no caso.

Todos têm a mesma religião: a Igreja da Luxúria, do Pecado e da Insegurança. Ficam doutrinados pela Santa Madre Igreja da Perdição e, como que com a culpa que os medievais sentiam em pecar, culpam-se por não conseguirem pecar. E querem pecar, nem que seja só para que vejam que está pecando.

Há também os fluxos migratórios e as diásporas, além das cruzadas. Sempre há povos que migram para outros lugares, em busca de espaço para existirem em paz. Muitos povos ganham maior exército, maior população e buscam mais e mais territórios para garantir para seus habitantes mais qualidade de dança e mais visibilidade para pecarem: elevam sua moral. Quanto às diásporas, me refiro aos povos que são provindos da mesma origem, mas que, por conhecerem outros povos ou por serem forçados por uma busca pela pegação ou pela pegação dos outros integrantes do seu antigo povo. E quem disse que me esqueci das Cruzadas. De um lado para o outro, as Cruzadas passam pelas cidades dos outros povos, pelas trilhas que levam um povoado a outro, sofrem perdas ao longo do caminho, encontram hostilidade dos outros povos que se sentem ultrajados por terem que ceder lugar aos malditos Cruzados, mas são excessivamente motivados pelo destino: o bar, o sofá, um lugar para conversar em grupo, um cantinho para a pegação – a maior demonstração de fé.

Sucesso

Todos os que escrevem o fazem como eu o faço, sobre a mesma coisa que eu, pensando, envolto numa onda de experiências diferentes, exatamente como penso. Há a inconformidade nas linhas de todos, há questionamentos sobre o que se pensa, há o que se pensa, há, de toda forma, a expressão da vida de cada um em sua escrita. O que faço não é arte, é desabafo, é tentativa de mostrar para mim mesmo como me sinto, tento entender-me melhor ao ler o que escrevo, deixo passar nos meus papéis traços que não sou capaz de falar, nem de pensar quando me analiso.

Ao som de uma música nova no silêncio musicado do meu quarto, escrevo nada além das expectativas artísticas que se tem em mim: não há expectativa. Se o que faço for lido e for aplaudido, me sentirei fruto de uma injustiça poética, em que muitos têm o que tenho, mas por questões sociológicas, arbitrárias, ou não, estaria lá, no mais alto patamar do reconhecimento que uma pessoa pode ter pelo que sente e pelo que exprime.

Nunca consigo encontrar um fim confortante no que escrevo, tenho que parar com isso.

quarta-feira, 19 de setembro de 2007

when my friend told me that story about our souls leaving our bodies when we sleep, i couldn't have taken her any seriously: she tried to enlight me about their "nightwalk", and was almost saying that they meet other soul-buddies meanwhile... but as soon as she stopped talking, i gave up resisting to think about and thought that the only reason why my soul would possibly leave my warm body in the middle of the night, and in the middle of my sleep, would be the possibility of escaping to his bed. and i wouldn't mind if she remained there untill the next day. she would be safe, i think.... and, finally, he would be more than just a wonderful-movie-like dream from which i wake up 4 am thinking that really happened. we could be siamese-spirits...
maria took me by the arm, and started to run, and told me we're late for classes.
and i forgot about dreams, souls, and about the two uncounscious hollow bodies that would fit better together...



; se eu soubesse escrever roteiro, teria feito disso uma cena - como eu imaginei. a lil' bit like leland.
meu inglês está muitíssimo arranhado, e am... acho que essas são todas as considerações finais.

terça-feira, 18 de setembro de 2007

Os Outros

O que são os outros que muito reflito sobre? O que eles representam na minha mente? O que são eles? Tive que observar o que pensava sobre eles e imputei uma dúvida metódica sobre o assunto. Comecei a perceber que tudo aquilo que eu percebia como nocivo nos outros era tudo aquilo que eu pensava como nocivo; tudo aquilo que pensava como bom nos outros era tudo aquilo que eu admirava em mim. Passei a pensar então que todos são iguais a mim e que, logo, todos são de certa forma iguais. Todos tem todas as características e as exibem. Mas as exibem em quantidades diferentes e em intensidades diferentes. Vi, então, que não são todos iguais, apesar de possuírem as mesmas condicionantes, ou seja, as mesmas formas e pensamentos e sentimentos e dúvidas. Percebi isso também ao ver que eu possuía todas as características comportamentais e sentimentais do mundo, mas nem sempre agia com as todas, agia mais com umas do que com outras, havia outras que não agia, apenas pensava sobre e outras que só demonstrava para poucos, outras para muitos e outras para mim; isso diferencia os humanos – possuem várias possibilidades de reações e sentimentos que mostram e várias possibilidades de circunstâncias para expô-las ou não, assim eles “escolhem”, em virtude de suas experiências, como vão distribuí-las.

E que diabos são os outros? São eles mesmos. E para mim? O que são? São o reflexo de tudo aquilo que há em mim, que se evidencia por se mostrar em situações e circunstâncias diferentes das que eu exponho as mesmas; para mim os outros são aquilo que não aceito em mim e eu sou a única coisa que aceito de mim, nos devidos momentos, é claro.

sexta-feira, 14 de setembro de 2007

Mais-valia de mim

Sou pobre de espírito, mas rico de cultura. Há coisas que Meu Espírito pede para serem feitas, mas o coitado ta muito mal-parado. Como uma pessoa comum, ele teve que entrar com um pedido na Ouvidoria do Antônio. Sabe como são essas burocracias estatais, né? O Espírito ficou lá, esperando, esperando e esperando, sentado numa cadeira de madeira com hastes de ferro, que mais pareciam um lugar privilegiado nos porões dos navios negreiros: não era tão ruim assim pra situação, tinha gente pior, em pé, mas ainda assim aquela cadeira era muito ruim. Depois que conseguiu ser atendido, a atendente, pessimamente humorada, declarou-lhe, entre telefonemas e conversas paralelas e alguma risadas e algumas perfurações dolorosas de fila, que a sua vontade ainda não poderia ser feita. O Meu Espírito então, voltou a trabalhar, entregar os seus rancores (como dava trabalho fazer um rancor, puxa vida, tomava-lhe mais de um dia) à Razão, que, achando-se esperta, explorava o pobre Espírito, que produzia, explorado e a base de chantagens, os sentimentos, para a minha razão manufaturá-la e vendê-la como cultura para mim, que repasso para os outros. Enfim, o Espírito acabou que não sabe mais o que pensa e pensa só o que mandam. Espírito nunca tinha parado pra pensar nas coisas que fazia, pois antes fazia as coisas sem pensá-las. Agora tem que pensá-las, mas não para si, para a Razão, pois ela tinha chegado, e obrigava o Espírito a trabalhar. Foi então que o Espírito começou a ficar triste, apático, só tinha tempo para dormir e pensar, não mais sentia sem pensar, passou a sentir pensando e pensar sentindo. Não era mais aquele velho sentimento, suave e alegre, companheiro. Foi a Razão, tudo culpa da Razão, estragou a vida dele, institucionalizou o Estado para servi-la, que acabou fazendo com que Espírito não mais pudesse exercer suas vontades sem antes as submeter aos olhos de alguém, a mando da Razão, que produzia cultura à base de sentimento como se fossem tênis da Nike numa indústria na China, e vendia para mim e eu para todos, e aquilo tinha um valor tão absurdo – cultura, hã... – que era capaz de explorar e controlar um sujeito tão único e especial. Era mesmo uma filha da puta! Maldita exploradora! Espírito então mobilizou os outros trabalhadores. Chamou os Órgãos, o Cérebro, os Animais, a Água, o Mundo. Tentaram a greve, mas a Razão tinha espiões por toda a parte: sabotou a greve. E logo em seguida convenceu a todos os outros membros de que a Razão poderia ser para todos. Mas o que se descobriu é que nem tudo é totalmente propriedade da Razão, o Espírito, o Cérebro, a Vaca, a Água, também tinham seus terrenos e como passaram a dever à Razão, suas terras passaram a ser do Espírito e da Razão, como do Cérebro e da Razão e etc. O Espírito foi ficando individualizado, sofreu bastante, mas acostumou-se com a tristeza. Hoje vive ainda de dar à Razão sentimentos, divide a sala com Cérebro, mas quase não se falam mais: a Razão semeou a discórdia – mas isso é segredo! A Razão é mesmo incrivelmente impressionante. E dominadora.

O Pântano

Pântano: etmologicamente o termo significa um terreno lodoso, alagadiço, obscuro, nevoento. O uso do adjetivo pantaneiro ou da locução do pântano passou a ser feito para designar coisas obscuras, calmas, nao muito ofensivas e um pouco tediosas. Porém, depois de um tempo, o uso passou a ser feito também para indicar um nível de intensidade pouco alto (mato e agreste vêm depois, consecutivamente).

quinta-feira, 13 de setembro de 2007

O Choro do Espírito

Nunca sei realmente se realmente sei o que sinto. Há horas em que o mundo me parece tão intenso, tantas informações e dúvidas, preocupações, problemas, que penso em coisas muito mais pesadas. Parece que nesses momentos é que realmente sou capaz de me exprimir e gosto muito mais do que escrevo, apesar de o viver não me apetecer tanto quanto. Então, passoa preocupar-me com o viver: quero que tudo me seja bom. Busco em mim maneiras de melhorar a vida. E encontro. Encontrei uma paz de vida e um distúrbio de espírito: a letra é meu espírito. Passo a não escrever tão bem, pois não há mais o peso da não-matéria forçando o lápis pela minha mão. Os pensamentos me mostram que não sou tão cheio de valor assim quanto pensava, e que tudo o que mais gosto de fazer nem tão bem o faço. Logo, turbulência na vida. O espírito começa a ficar de bem, consegue viver, pois vive em sonho, pois passo a sonhar, pois não me alegra a realidade, pois estava alegre com a vida e essa alegria repudiei. Mas agora, depois do derrame do espírito, talvez eu possa por um tempo acalmar a vida e deixar o espírito chupando dedo. Daqui a pouco ele chora de novo...

terça-feira, 11 de setembro de 2007

Propostas Não-Filosóficas

Vamos parar de preocupação. O que é o mundo, para onde vamos, quem somos, todas essas perguntas já possuem respostas: não há resposta. Mas não aceitamos isso, pois não queremos a resposta, queremos a pergunta. Vamos deixar essa loucura de sapiência de lado, não precisamos dessa neurose pelo exato e pelo determinado que nós buscamos. Já se sabe que a Verdade não existe. Que o que se busca como verdade, sempre será fruto de subjetividade. Mas continuamos a nos questionar. Por quê? Não há resposta. O que não é empírico não é passível de prova. Nem de contestação. Portanto, se vamos falar de metafísica, que paremos de nos problematizar com ela, de torná-la algo que nos “encuque”. Não temos de nos estigmatizar com a verdade, a morte nos mostrará o que é não ser, não subjetivar e, por isso não devemos nos antecipar, nos esquematizar, planejar. Por favor, passemos do estado de preocupação animal com o imprevisto e aproveitemos por sabermos da morte. Aproveitemos a vida enquanto vida, pois a morte não terá proveito, pois não haverá pensamento nem subjetivo. Que se busque o ébrio, o prazeroso, o proveito, o prazer, da maneira que esse prazer se colocar para você. Que haja o momento em que todos brindem a vida e não discutam-na. Comemorem enquanto podem e deixem a vida leve como ela é, não pesemo-la. Não há fim na descoberta da Verdade e das idéias não empíricas, portanto buscá-la é perda de tempo. Comparado ao eterno e ao infinito e à verdadeira verdade, o que é toda essa verdade subjetiva de argumentação e sobreposição de idéias de verdade? Nada. Nada ela corresponde ao todo, portanto é-se insuficiente a razão para esse tipo de solução: a razão, como adaptação evolutiva, é prática. Maldito e ao mesmo tempo bendito o homem que se questionou sobre a existência ao ver o fim do próximo com a morte. Maldito por criar a dúvida e a Náusea e seres em dúvida e a infelicidade feliz de toda uma espécie. Bendito por nos possibilitar descobrir que não se descobre, mas que se ousa descobrir. Aproveitemos as descobertas filosóficas e escutemos a resposta que ela já nos deu há tempos. Como bom inquiridor da verdade, o filósofo deve saber que a resposta que se encontra nem sempre é a que se quer encontrar. Paremos de querer encontrar as nossas verdades, individualmente: ela não existe. A consciência é para se gozar dela. Proponho, inacreditavelmente ou até ousadamente, o Fim da Filosofia. É Hora de Fechar a Janela.

Anti Tese

A liberdade consiste em não relacionar mais com nada a liberdade. A liberdade consiste em ser livre sem depender de libertar-se de algo. A liberdade consiste em encontrar o estado que não necessita da tese para haver a antítese. A liberdade consiste em negação à matéria. A liberdade consiste em não precisar negar para obter o que queremos negando. A liberdade consiste em parar de buscar o que nos liberta. A liberdade consiste em não termos mais ânsias para a liberdade, pois já seremos livres. A liberdade consiste em estagnação, apatia, conformidade. A liberdade consiste em alienação. A liberdade consiste em morte. Não quero morrer, quero viver nessa prisão ingrata, mas que me permite viver e pensar e buscar me libertar.

segunda-feira, 10 de setembro de 2007

Das situações de alienação (de si próprio).

Estavam sentados em um lugar-qualquer do Jardim Botânico num silêncio tranqüilo através do qual freqüentemente se comunicavam.
- Ela é, de certo, um espírito-argumentador. - Josias, que em absoluto não conhecia filosofia, pensava coisas profundas sobre Marina, que espreguiçava-se preguiçosamente em seu colo, e se endagava sobre assuntos que considerava relevantes.
Para começar, ela olhava para a vida como quem enxerga em cada obstrução uma criativa possibilidade de drible - que era a prova irrefutável de sua vitalidade. Os argumentos eram sua chave para todas as portas: ela costumava dizer que a verdade instituída pelos rituais da moral tem inúmeras brechas e é infinitamente mais corruptível que a verdade instituída por si próprio. Isso quer dizer que quaisquer que sejam seus motivos ao longo de seu trajeto, serão sempre mais impetuosos que as represálias cometidas por entidades externas a ela. No fundo, Marina tinha pra si que o mundo existir tal qual ele existe no momento não era "mérito" dessas verdades estabelecidas, mas daqueles que tiveram bons argumentos para refutá-las.
Argumentar era a força-motriz de sua existência. Podia parecer um motivo deveras superficial, mas chave de carro e carteira assinada eram elementos dos quais corria a plenos pulmões.
- Concluí, então, que Marina não cabe. Não cabe em seu decote, nem no meio de minhas pernas. Não cabe em horários marcados para consulta, não cabe em seus hábitos, não caminha em linha reta, não cabe em cordialidades. Não cabe nos esquadros, ou entre as margens de um quadro. - Não cabe em Josias, em si, nem em silêncios tranqüilos. E não há nada mais peverso que o desejo de dominar o que existe em sentido expansivo que acometia Josias, e ele, em um insight, percebeu. Sentia-se tão irrevogavelmente preso a esse desejo, que, de dominador passara a dominado, a partir daquele dia.

domingo, 9 de setembro de 2007

A Verdade

O homem sempre foge da Hora de Fechar a Janela, embora inconscientemente a busque. Nós, humanos, queremos o não-ser, a objetividade, a verdade, mas o fechamento da janlea nos tiraria essa vontade: já o seríamos. Ao mesmo tempo, queremos viver, queremos ser um só e tomamos como absoluto o que é particular. A morte, o fechamento da janela, o apagar das luzes, nos remete à não mais necessidade de luz, de alma, de vista. A janela fecharia e observaríamos o escuro, o nada, o tudo, nào observaremos. Mas se o que se busca é o tudo, por que temer a morte?

O indivíduo (particular mas ao mesmo tempo todods os indivíduos) quer muito além de Deus. Ele quer ser o seu Deus. Não quer saber da verdade, mas criar uma verdade por si próprio que valha como objetivo para o objetivo. Queremos convencer o mundo da noss verdade e não nos convencermos da verdade do mundo. Não aceitamos perder debates e nos colocamos, desde o surgimento do pensamento, em oposição ao mundo.

Ao buscar convencer-se de que a sua verdade o aproxima da verdade absoluta, julgamos que poderíamos, individualmente, reportar, sob nosso ponto de vista, o todo. Demos, então, à subjetividade o poder objetivo e ainda não o tiramos dela.

E quando falamos de razão e de verdade, descobrimos o nada da morte. A morte então seria a negação da verdade, que, até hoje, está centrada no subjetivismo. A crença de que a época das luzes, o clacissismo e tudo o que a inteligência e o sol da razão nos trouxe são benévolos e progressistas, compreende a natureza de qualquer ser que se reconhece como tal. Isso mostra que o isso nos trouxe foi uma farsa. O homem busca provar individualmente sua certeza, o que faz com que a razão seja usada para a argumentação e não para a aproximação da verdade. Mostra que toda essa busca científica e filosófica foi uma busca pela inverdade, marcada pela presunção humana.

O que proponho é que isso não terá fim e que somente a morte encontra o fim de todas as interpetações. Proponho que com a morte deixamos de ser - ser, concebo como individualizar a existência - e passamos à eternidade, de maneira não religiosa nem transcendental. A morte, fisicamente, nos decompõe em átomos, o que nos faz pertencer ao mundo não individualizadamente. Filosoficamente, paramos de ter a possibilidade de questionar e, assim, somos a Hora de Fechar a Janela. Mortos, não temos necessidades e também não pensamos, pois a ninguém teríamos que convencer da nossa verdade, seríamos, entretanto, toda a verdade. Seríamos a própria falta de luz, de sol, seríamos a própria morte.

sábado, 8 de setembro de 2007

Vítor e Cris

Vítor estava lá, como todos os dias, na cozinha, terminando de pôr a mesa do jantar e ajeitando os preparativos. Por último, colocou a tábua de madeira sobre a bancada da pia e cortou um pouco de cebolinha para botar, como um toque final, sabe, pra enfeitar, sobre o escalopinho de filé mignon, que fora preparado durante toda uma tarde, sob gritarias das crianças antes da escola e depois leva as crianças na escola e entregas da farmácia e da padaria e do mercado e chegou o sedex da Cris também, ih, merda, tem que buscar as crianças na escola, mas a carne ta no fogo! Ahhhhh, caralho! Deu tudo certo, agora é só terminar de picar a cebolinha e esperar pela Cris.


Cortava a cebolinha calmamente, animado e ansioso pela chegada da Cris. Mas ela podia demorar um pouquinho, para dar tempo de trocar o avental, tomar um banho e esperar por ela sentado no sofá vendo o Jornal Nacional. Tchoc, Tchoc, Tchoc, cortava a cebolinha. Dindom! Ai! Vítor cortou a ponta do dedo, ai, que dor, ih, tocou a campainha, deve ser a Cris. Que droga, ainda estava de avental, fedendo a cozinha e a Cris tinha acabado de chegar, não podia ser, mas ela é mulher dele, vai entender que demorou preparando algo especial e com certeza ia esperá-lo, sem problemas, para jantarem juntos.


Cris chegou super cansada, não agüentava mais de tanto trabalho e olhou tudo aquilo diferente do normal em cima da mesa, as coisas pareciam mais célebres quando olhou em volta. Viu Vítor saindo correndo para o quarto (percebeu depois que tinha ido somente ao banheiro, mas mesmo assim, trancou a porta da suíte) e não entendeu nada. Bateu na porta, queria entrar, deixar as coisas, trocar a roupa que tinha vindo da rua, passar uma água no rosto e, enfim, começar a jantar, depois ver TV, começar a dormir no sofá, depois ser acordado por Vítor, ou mais provavelmente por umas de suas filhas, e iria cambaleando para o quarto, deitar a cabeça como chumbo no travesseiro e, sem preparar-se, acordar e ir trabalhar no dia seguinte, quase que mecanizadamente.


Como não pôde entrar no quarto, Cris ficou de mau-humor: queria trocar o absorvente que não tinha trocado desde que saíra de casa às 9 da manhã. A comida estava posta à mesa, a televisão desligada. Cris ligou a televisão e começou a beliscar a comida, que estava deliciosa. Pegava um pedaço da carne (ainda sem cebolinha) e ia comendo na mão até chegar perto da televisão. Era o caso Rennan Calheiros, ele era um imbecil, já devia ter renunciado. E o Lula, sempre aparecia nesses seus comícios idiotas, falando sem parar, bolsa família, PAC, e tinha também o julgamento dos 40 réus – todos uns imbecis ladrões, e o dinheiro pra nossa educação? – que não saía dos jornais nunca. A carne estava realmente deliciosa. Cris então, tirou o terninho, deixou nas costas da cadeira da sala, desabotoou a blusa, levantou um pouco a saia para que pudesse sentar mais confortavelmente, e gritou para Vítor:


- Ô, meu bem, como é que é? Tô cansadona, quero trocar de roupa, quem sabe até tomar um banho, vamos logo aí prá gente jantar de uma vez!


Foi então que Vítor, um pouco sem entender por que Cris estava falando naquele tom naquele dia TÃO especial, saiu do quarto, de blazer, uma calça social, perfumado, sorridente e com todo o glamour que aquele dia merecia. Viu sentada no sofá, toda esparramada, sua mulher, Cris, acompanhando o jornal, com cara de saco-cheio, que, ao ver que Vítor tinha saído do quarto, já se levantava rapidamente como quem ia ao banheiro, trocar de roupa e etc. Cris olhou para Vítor e parou o que ia fazer, olhou-o de cima a baixo e perguntou:


- É hoje o dia de você encontrar os rapazes? Não era às quintas?


- Você realmente acha que eu me arrumaria todo desse jeito para encontrar meus amigos? Não acredito, Cris! Não posso crer! Vamos ver o que você tem a dizer, tô te dando um crédito de uma resposta, o que que será que você vai me dizer?


- Eu, hein, Vítor, não entendi o por quê desse tom arrebatador... vamos jantar logo de uma vez que eu to morrendo de fome e ainda vai passar a novela que eu quero muito ver... QUEM MATOU THAÍS!? Apostei com a Gilda no trabalho que foi a Marion.


- Eu não to acreditaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaando! Olha só, Cris, você ta esquecendo o NOSSO aniversário! Você realmente acha que eu me arrumei toda pra encontrar os meus amigos? Você acha que a mesa ta toda posta só por acaso? Você também nem me esperou pra jantar... deu pra ver que pode ser aniversário, dia comum, não importa, né, você sempre vai ser indiferente a mim, ta vendo, olha só pra isso, já saiu comendo a carne com a mão, fica aí de terno, não trouxe nem um presente... Cris, o que que ta acontecendo com você, o que que ta acontecendo com a gente, me fala, me deixa ajudar, o Mauro, do 602, me deu o contato de um pai de santo ótimo, deve ter algum encosto, e o Gilmar, aquele que estudou comigo há anos e casou com a Maria, lá da repartição da Joana, que trabalhou com você na empresa... – fica alguns segundos parado, olhando para Cris, que quase boceja ao ouvir tudo isso – é, Cris, acho que o problema não é nosso não, o problema é seu mesmo, você não liga pra mim, você só pensa no trabalho, e as crianças? Quando que você vai arruma um “tempinho” pra elas? Todo fim de semana você tem que trabalhar num projeto, ou resolver alguma coisa urgente, se não seu chefe te mata! Elas sentem sua falta, Cris! Eu também sinto a sua falta, você nunca mais esteve aqui pra mim, tenho precisado tanto de você, queria dividir com você a minha vida, divide comigo a sua! – percebe de novo que Cris olha entediado – Eu devia arrumar um emprego sabe... devia parar de ficar cobrando de você, mas aí, depois, não vai pedir pra mim pra que eu pare de trabalhar não, não vale pedir pra ficar com as crianças não....


Ainda abobada e, confessadamente, entediada, Cris tentou se desculpar:


- Pô, Vítor, é claro que eu me importo com você, mas eu não sei o que que aconteceu hoje, tive muitas coisas lá no trabalho, acabei me esquecendo, mas amanhã, eu juro, amanhã a gente sai, vai no melhor restaurante


Vítor interrompeu bruscamente:


- Você acha realmente que você me compra com restaurante caro? – Vítor começa a chorar descompensadamente – VOCÊ NÃO LIGA PARA OS MEUS SENTIMENTOS!


- Vítor, meu bem, não fica assim, olha só, tudo isso que eu te dou! Essa casa, essa vida, você sempre sai com seus amigos quando você quiser!


- Mas eu não tenho sexo, Cris, eu não tenho SE-XO! Pronto, falei, acho que é isso que ta me deixando maluco! Você ta sempre com sono, sempre dorme no sofá, chega tarde, só come e dorme, o que que ta acontecendo, você não tem mais tesão em mim? Eu to inda à academia, to assistindo GNT, fazendo a dieta da proteína... – toca o telefone de Cris, que atende e fala baixinho e desliga logo – Quem foi que ligou, ein? Quem foi, deixa eu ver quem ligou, deixa eu ver seu celular!


- Você ta louco, Vítor, não dou não, você ta ficando maluco!


- Me dá agora! Sua desgraçada, quem é o outro? Por isso que a gente não se dá mais bem, Cris... aaaaaaaaaaaaaaaahhhh hã hã hã hã hã!!!! Eu quero o divórcio!!!!!!!! Você sempre foi uma péssima mulher! O Mauro do 602 sempre me falou da mulher dele, que nunca deixou faltar nada, eles têm até empregada, você sabia? Quantas vezes você não esqueceu de deixar dinheiro pra comprar as coisas aqui, eu sempre ferrado e você aí, indo pro Chile pela empresa, o que que você faz com o dinheiro, Cristina Maria? Olha, eu não tenho que saber mais de nada, você trate agora com o meu advogado, você me entendeu? Olha que vergonha, acabar o casamento no dia do aniversário, só você mesmo pra proporcionar esse triste fim para nós! Mas quanto ao que eu tiver dinheiro, a gente conversa depois...


- Você ta maluco, Vítor!


Cris não levou a sério. Vítor entrou no quarto, fez suas coisas, arrumou as coisas das crianças, enquanto Vítor via televisão sem acreditar muito no que estava acontecendo, sempre esperando que tudo fosse se normalizar e ele iria, no dia seguinte, acordar mal humorado, ir para o trabalho mal humorado, voltar de lá mau humorado, mas não era isso que acontecia naquele momento.


Vítor foi realmente embora de casa, com os filhos. Ficou alguns dias na casa da mãe, não deixou por 2 meses que as crianças vissem a mãe. Três anos depois, ficou decidido pela justiça que Vítor ficaria com a casa, com o carro, com a casa de Teresópolis e com metade do dinheiro que Cris tinha juntado há anos com o trabalho.


É, esse movimento machista realmente deu muita moral para esses homens...

Coisas que anoto:

- Escrever sobre: o que pessoas pensam em seus psicólogos, as importâncias diferentes e devidamente dadas de cada um com cada coisa, que acaba por mostrar, pelo próprio indivíduo que busca importância para si, a desimportância dos indivíduos.

- Escolhas não são eternas.

Cadê?

Empanzinado de tédio,
Acabei-me inerte de espectativas.
Só por causa da inércia
Sinto que o tempo é distraído.

Cansado de rima, cansado de arte,
A arte não tem mais nome.
E o que dele se veste,
Não faz mais juz ao que expõe.

O novo já é velho
Não há o que revolucionar.
Quando o drástico é não mais que drástico,
E o novo com novidade some.

Sai daqui meu tempo!
Quero me libertar,
Quero estar fora do sonho!
Apesar de com ele ainda sonhar...

terça-feira, 4 de setembro de 2007

Um Suspiro

Já estava no fim da vida. Tinha feito muitas coisas boas para si, muitas outras ruins para os outros. Tinha gastado já todo o dinheiro que tinha. Utilizara-se da sua fortuna tal qual um católico: de modo contemplativo, não se preocupara em manter a riqueza, preocupou-se apenas em contemplar as benfeitorias que tal circunstância o havia trazido. O que gostava não era da riqueza ou do dinheiro que tinha, muito pelo contrário, tinha ódio dele, gostava mesmo era do que aquilo traria para ele e por isso o gastava sempre muito rapidamente: comprava tudo o que ele podia comprar, não queria sujar suas mãos com aquilo. Mas, como havia começado a escrever, já estava no fim da vida e já não tinha mais nada também. Não que agora ele começasse a dar valor ao dinheiro, mas dava ainda mais valor ao que ele o proporcionava, e isso só trazia mais raiva do dinheiro. Talvez fosse uma raiva de si mesmo, de não ter conseguido conviver pacificamente com algo que odiasse tanto: quem sabe hoje não teria que exigir coisas dos outros ou coagi-los a darem-lhe.


Pensava que não deveria se arrepender de nada que fez. Pensava em tudo o que havia feito novamente, para não concluir precipitadamente sua falta de arrependimento. Lembrou da infância, que nem sequer sabia das coisas que amava ou que iria amar... pulou essa parte, pois nada o que poderia arrepender-lhe tinha origem nessa época. Lembrou depois das suas festas e das suas brigas com todos da família e de tudo o que conseguia daquela maldita família e de tudo o que diziam sobre ele ser o preferido dos pais e de tudo o que havia feito contra os possíveis membros da família e da mulher que amou e casou e que, quando transformado em família, também maltratou o casamento, e sua nova família. Lembrou também de tudo o que fez por fora das famílias, e de todas as famílias que fez por fora e de todos da família que indiretamente colocou pra fora das famílias. Lembrou também de tudo o que tinha feito que muitos queriam viver fazendo. Lembrou que não trabalhou, que sempre teve dinheiro, que nunca se coçou para nada e que sempre teve, mesmo não querendo, muitas coisas aos seus pés.


Concluiu, agora verdadeiramente, que não havia se arrependido realmente de nada que fez. Usou de tudo aquilo que gera as discordâncias sociais, as trapaças e nunca fez nada por isso. Estudou o que estudou somente por prazer. Fez tudo o que todos que trabalham muito para descansarem no final gostariam de fazer: foi um bon vivent. E concluiu depois de tudo, que ter sido o que foi era a maior crítica ao mundo que poderia fazer: quando o contexto internacional era bilateral, ele era alateral. Vivia por si próprio, agia para si próprio, pois a vida só o era para si próprio, e quando precisou realmente dos outros, eles, por não se libertarem de suas obrigações pessoais, acabaram por sustentá-lo, dando base à sua boemia. Ou seja, sua esbórnia não prejudicara a sustentabilidade final da vida que a todos muito preocupa. Viveu de maneira única, pois a vida é única. Não se preocupou com legados, pois legados não têm valor quando não se os vê. Não se preocupava com críticas e nem pensava sobre o que lhe diziam que deveria fazer, viveu sua vida.


E no fim da vida, pensou sobre o fim da vida. Sobre o fim de uma existência que ele mesmo achava digna, que ele mesmo julgava que era o que queria ter feito. Mas o fim não era agradável mesmo para quem se confortava com a vida que tinha. Talvez pesasse muito mais para ele o fim: soube de tudo o que se podia fazer em vida, pois o havia feito, e por isso fim pesava, nunca mais poderia ser capaz de ser. Ou de saber que era. Fechou os olhos e tentou imaginar o peso da morte sobre suas pálpebras. Chorou. Parou de pensar por alguns instantes, enquanto chorava. Pensou que não tinha ninguém que realmente amasse, a não ser a si. Entendeu que, por isso, não o amavam e o deixavam sozinho. Fechou novamente os olhos.


Olhou para frente, viu o prato de comida e não comeu. Ligou a televisão: precisava descansar a vista, a mente, a vida.

colligere - o poder do pensamento negativo

"O poder do pensamento negativo
Como podemos agir quando nos acostumamos a sentar e assistir?
As lições e o conhecimento estão no quadro.
A verdade e a salvação, no altar.
- E as imagens da vida na tela.
- Nós trocamos os desejos por aceitação.
- Natureza é conflito.
Sociedade é submissão.
- Agir não é apenas fazer alguma coisa.
Nossas ações constroem e alteram a realidade.
Para que e para quem estamos agindo?
As pessoas têm seu papel e você aprende o seu no jornal ou na
escola. Aprende em casa como se comportar, para ser um
trabalhador passivo, ou um chefe insensível ou um ladrão.
Isto é educação, de qualquer forma.
Nos ensinam o destino, mas não de onde provém.
Somos apenas coadjuvantes neste espetáculo e talvez isto
explique a existência de heróis: pessoas como nunca vamos ser,
livres e fortes. Talvez isto explique a existência de ídolos,
pessoas como nunca poderemos ser...
Você aprende o que comprar para esquecer a falta de poder e
liberdade.
Sua vida vai embora mas você reza para o tempo passar rápido,
até o próximo fim de semana.
No final é apenas uma questão de aceitar as regras, abrir mão de
algumas coisas para ter outras.
Natureza é conflito.
Sociedade é submissão.
A conveniência se impõe sobre a liberdade e o poder sobre a
vontade. Quem constrói a verdade controla sua vida.
Cansados de perder alguns tentam mudar por dentro."

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sábado, 1 de setembro de 2007

Ideologia

Quero viver sem ideologia. Quero copular e brincar e me drogar e conversar e estudar e trabalhar e escrever sem culpa de viver sem ideologia. A vida sem uma ideal visão de mundo acaba trazendo culpa. Culpa de quem não se preocupa com o mundo. Culpa de quem não quer ouvir sim e não se assusta em ouvir não. Culpa de quem não busca solução para si ideologicamente, só não tendo ideologia. Culpa de quem tem a não-ideologia como ideologia. Culpa de quem se sente culpado por sua ideologia. Culpa de quem sabe do sistema, e sabe as limitações que ele te determina e sabe que não quer viver no sistema e sabe que não há como não viver no sistema e sabe que foge de ideologias para fugir do sistema e sabe que se culpa por tudo isso que sabe. Culpa de quem sabe que sabe que tem culpa.