segunda-feira, 5 de abril de 2010

Alguma descrição, alguma justificativa

Olá, eu sou uma salamandra e meu nome é Salamandra. Sei que esse não é o melhor jeito de começar qualquer coisa escrita, mas é que eu não costumo fazer essas coisas. Aliás, poucas vezes acreditei realmente que fosse capaz de escrever alguma coisa sobre alguém, sobre mim, sobre o mundo. Sempre que penso em escrever, me sinto ou muito afobado, botando as carroças nas frentes dos bois e dizendo uma grande mentira, ou então muito cuidadoso, ao ponto de elucidar tantas nuances adversas que meu pensamento se anularia. Mas há alguém, uma figura, uma pessoa que freqüenta um mesmo bar (poderia chamar de boate?) em Botafogo que eu. Na verdade, há tempos que não o via por lá; e esse livro (se é que chegará a seu cabo, do jeito que sou...) só surgiu em razão deste sumiço. Seu desaparecimento mexeu comigo. Sua imagem, confesso que um pouco chata e desgastada, de tão espalhafatoso e recorrente que ele era nesse lugar que eu frequento, era algo como que típico, original, de certa forma até fascinante. falava alto, por estar sempre bêbado, gesticulava muito e, se não estava rindo de alguém, estava rindo tão anti-cristãmente que parecia muito estar rindo alguém mesmo. Do jeito que sou salamandra, de espécie e de nome, já paranoiei inúmeras vezes com sua risada - e não duvido nada que ele já tenha rido de mim. Ele em geral vivia meio suado, era gordinho e seus trejeitos, suas risadas, mesmo que rodeado de amigos dos mais variados, não escondiam, pelo menos para mim: ele era homossexual. Já fiquei na dúvida, mas ele não queria saber de nada e às vezes aparecia com algum affair. Tunico Ribeiro (esse era seu nome), como era de se esperar, já fez muitos de seus amigos passarem vergonha e já constrangeu muitos outros semi-conhecidos. Quando você achava que ele já não podia mostrar mais nenhuma chatice, inconveniência, ele vinha com mais uma neurose sua, com mais um comentário ofensivo, ele parecia um enorme buraco por onde saíam pontos de exclamação às profusões! Ah, o Tunico Ribeiro era ótimo, na verdade, uma grande figura, e eu não pude ficar parado frente ao seu desaparecimento. Havia naquele sujeito uma sujeira, uma indiscrição e ao mesmo tempo uma pertinência que só diz respeito a almas de artistas! Mas ele era tão poeta que sua poesia era ele mesmo, com sua rispidez, com sua risada, com seus eventuais perdigotos esbravejados com seus amigos e meros conhecidos, com suas idiossincrasias (já vi Tunico Ribeiro chorar! sempre gritando e xingando e chocando, é claro!). Ah, Tunico, você era de uma existência tão sarcástica e tão típica que seu sumiço não podia sumir com a sua figura! Como filmes que fazem sobre célebres mortos, resolvi escrever sobre Tunico Ribeiro, homem que nunca mais surgirá igual, foi uma última gota de um esgoto a céu aberto canalizado! Tunico, você que nunca cumprimentei, exceto uma vez que me apontaste do outro lado da rua e eu te levantei meu chapéu, irritado, envergonhado; Tunico, você vai se tornar obra de arte, embora fosse muito mais enquanto cuspido e escarrado! Você sumiu e é preciso fazer essa denúncia, explanar essa tragédia, mostrar a todos o que aconteceu com você!

Um comentário:

Gabriela Caruso disse...

Voooolta Tunicoooooooooo!