quarta-feira, 29 de março de 2017

a gênese do golpe de 64

Torna-se fundamental, então, explicar as raízes econômicas do sucedido desde a formação do Estado Novo até a criação da UDN e a realização do golpe civil-militar de 64. Não se esqueça o nome de Revolução dado pelos seus idealizadores, muito menos a sua origem política. Por que seriam eles revolucionários? Muito bem: como bons sociólogos, ingenuamente reivindicavam para si o poder político com interesse de redistribuir para os setores médios um dado poder econômico que desses setores teria sido furtado. Mas não teria sido o mesmo motivo aquele que inspirou a Revolução de 30? Eu diria que sim: sublimada a inveja para o nome de "bem-comum brasileiro", as elites dissidentes que teriam se organizado em volta de Vargas buscariam a redistribuição de um excedente gerado pelo café paulista. Não digo que elas se tratassem de setores pobres, mas de setores empobrecidos, em decadência. Talvez não seja muito indigno dizer que as elites que fundaram a moderna tradição brasileira invejassem a crescente burguesia paulista. A maturação desse sentimento, por experimentarem a decadência de seu patrimônio diante de atividades econômicas já pouco lucrativas ao longo de toda a Primeira República (talvez desde 1808...), se converteu em um ideário de bem comum brasileiro -- e em pura cultura brasileira. Pois bem: redistribuir-se-ia o excedente paulista por toda extensão do território brasileiro; e ainda se criaria uma classe média urbana, brasileira, até então ínfima e pouco expressiva politicamente. Pronto: esse setor médio, ele também invejoso ao fim do primeiro Varguismo, se organizaria em torno dos líderes dissidentes do próprio regime de Vargas (Dutra e Góis Monteiro), para realizar a nova Revolução Brasileira. Surgiu no sentimento de inveja das classes médias brasileiras em relação às elites oligárquicas que se beneficiaram do Varguismo o apoio político -- e no revanchismo paulista o embasamento econômico. A Revolução de 30 capitalizou-se dos setores médios com apoio econômico das elites dissidentes. 1964 seria um movimento análogo, de capitalização políticas nos setores médios ressentidos com o isolamento do poder na era Vargas, mas com apoio econômico da elite paulista: e, assim, criou-se uma nova cultura brasileira. Fiat Lux -- e faça-se a Rede Globo. Resta ainda saber melhor as raízes do ressentimento médio com o politburo varguista, e para isso será preciso analisar melhor a constituição da classe média brasileiro no sentido da genealogia demográfica: método que provavelmente reconhecerá nos setores médios urbanos os primos pobres das oligarquias dissidentes de 30. E como conseguiriam as classes médias, apoiadas pela burguesia paulista agora -- portanto impedidas de expropriá-la --, o poder econômico de que teriam sido furtadas? Poupança externa, importação alta, às custas imediatistas e "existencialistas" da nossa frágil balança comercial. A Guerra-Fria teve um papel de roupagem ideológica fundamental para esse processo, tendo os interesses dessa classe social assumido o discurso da necessidade americana de maneira instintiva, fisiológica: foi-lhes garantida a História que queriam, e alguma vingança.

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