quarta-feira, 16 de agosto de 2017

a força do impulso vital

O desejo de perpetuação do próprio gen individual de cada ser humano (impulso vital) não é dotado de todo o domínio da verdade. Ela esconde-se atrás de um illusio que determina por onde o gen deve atacar. Se o legado e a vida após a morte representavam o illusio do gen de antes da modernidade, a própria força do gen, pela lógica do erro e do acerto, ampliou a acumulação do conhecimento conforme a sociedade foi crescendo de tamanho e atualizou a noção contemporânea de verdade: o aumento de uma comunidade impulsiona a capacidade que a humanidade tem de percepção da realidade, e a verdade se torna progressivamente mais clara, quanto maiores são as bibliotecas; para que mais gens se perpetuem, a ciência se desenvolve mais, chegando o conhecimento humano a um ponto em que o ateísmo e o medo da morte encerram a vida além-mundo, a ideia de legado e até a importância instintiva da transgeracionalidade genética. Nasce o desejo instintivo pela imortalidade na Terra, e ocorre o desenvolvimento do conflito entre duas razões básicas, que inauguram o mundo pós-deus: a razão para a imortalidade terrena e a razão para a vida única. O instinto humano de preservação da vida, observando-se a sociedade como um todo, se percebe mais facilmente - e com força dominante -, tendo a expectativa média de vida apenas se alongado com o progresso técnico e científico. Essa parece ser a tendência da humanidade em seu conjunto, perseguir a razão instintiva, da imortalidade. Mas os artistas decadentistas, por outro lado, talvez dos poucos que experimentaram a razão da vida única, mostram a latência dessa razão, cada vez mais percebida no drama "microscópico" da vida cotidiana, e que parece ser mais racional, sabendo-se da improbabilidade de se alcançar a imortalidade no prazo de uma vida atual. Esse me parece ser o embate ideológico estruturante desde que a humanidade passou pelos séculos das luzes e das dores: filisteísmo, longevidade e imortalidade de um lado e decadentismo, hedonismo e tragédia da vida de outro.

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