domingo, 18 de outubro de 2009

conceituando vontade num lugar histórico moderno

Partindo do pressuposto de que somos ensinados a sobrepor a moral às nossas ações, procuro vislumbrar as consequências da atitude contrária: nossas ações virem à frente das nossas morais. Mas é então que me confundo, me confundo nos meios pelos quais se poderia inverter esse mecanismo moral, me confundo ao pensar a que grau de ações isso se refere, me confundo ao pensar as consequências disso, se for aplicado a tudo, a toda e qualquer instância em que a moral - ou qualquer outro dispositivo - minimamente controla os homens e mantém certa ordem, certo respeito.

Para que eu mesmo possa compreender melhor essa reflexão, resolvi mapear como se formam as vontades dos homens, aquilo que vai lhes guiar as ações, aquilo que é o que será impedido ou movido pela moral, se ela vier de cima pra baixo ou de baixo pra cima, respectivamente. Porque sim, os homens podem ter muitas vontades, das mais variadas possíveis, e não pretendo classificar essa vontades em categorias. Assim, o lugar aonde quero chegar com essa reflexão é basicamente este: que instância seria aquela que limita inconscientemente as vontades e as aspirações dos homens, e a que essa instância estaria relacionada, se não é com a moral?

Para responder a essa pergunta, procuro recorrer ao meu precário conhecimento sobre Hegel. Do pouquíssimo que aprendi, entendi que Hegel lança a perspectiva histórica da razão, ou seja, a razão é histórica porque a razão é a história. Recortei essa informação e tentei aplicá-la, encaixá-la nas minhas divagações: essa razão história também seria aplicável a padrões morais. Sendo assim, a moral não seria algo estanque; a moral de cada tempo e espaço (pegando emprestado a terminologia de Kant), isto é, a moral de cada lugar histórico é determinada pela razão história. Isso determinaria que os homens hoje têm vontades que condizem mais com as disponibilidades de seu lugar histórico.

Essa hipótese me pareceu satisfatória por um motivo principal: o fato de os homens terem, de acordo com seu momento histórico, motores diferentes para ações, ou seja, são apresentados aos homens determinadas circunstâncias que os homens absorvem por viverem naquele tempo e espaço. Essas circunstâncias é que determinariam que tipo de vontades essas pessoas podem ter, fisicamente falando. Uma pessoa que nasceu no Egito antigo teve tais e tais experiências que uma pessoa que nasceu no tibete da atualidade não teve; as possibilidades físicas pras vontades têm que ser anteriores à vontade.

O que eu conclui dessa reflexão acerca dos limites das vontades foi justamente que as vontades que surgem nos homens estão relacionadas ao seu lugar histórico, ou seja, a razão história vai expor aos homens as circunstâncias em que eles se encontram, e as vontades que surgirem nos homens em cada época vão estar restritas aos limites da condicionante razão história. As consequências da inversão moral que se vem propondo, portanto, não quer dizer que vamos agir como bufões na Idade Média. Pode até ser, em casos individuais, por motivos de uma biografia. Mas se formos tratar de um ponto de vista mais amplo, aquilo que motiva os homens modernos é a realização. Os homens, na contemporaneidade, conseguem compreender a necessidade da civilidade, mas têm dificuldade de ir atrás de suas próprias realizações.

Assim, entendo que os homens, que racionalmente (razão história) encontram motivos para conservarem algumas conquistas civis, e políticas, por consequência, devem agir de acordo com suas vontades de realização, e não que os homens devessem exercitar atitudes diabólicas. Os homens devem buscar, em si mesmos, no seu conhece-te a ti mesmo, quais são as suas vontades, tendo em vista toda a disposição racional histórica de seu lugar. Entendo também que a educação, para essa proposta, não deve ser banida permitindo, portanto, que os homens ajam animalescamente por aí - me arrisco a dizer que cultura é da natureza humana. As conquistas civis e políticas, dessa forma, devem ser mantidas e deve ser mostrado aos homens todas as possibilidades de realização de vontades que há na sua sociedade. A educação deve instigar os homens a realizarem-se na própria cultura, na própria razão história de seu lugar, e não deve ser despoticamente moralizadora, indicando o correto e o incorreto eternos, o que gera a culpa, o medo, o ódio e a inércia. A moral de cima para baixo impede os homens de conhecerem-se a si mesmos, isto é, de irem buscar em se lugar histórico os caminhos para a sua realização, os caminhos para sentirem-se exercedores de suas vontades.

Um comentário:

bic_cristal_pocket disse...

Gostei de voltar a ver um comentário teu no meu blog. Já tinha passado por aqui a pouco tempo e gostei de voltar a ler. Irei passar mais vezes com certeza.
:)

Gostei deste post. Já tinha reflectido sobre este ponto de vista, mas nunca encontrei uma forma tão clara de o escrever. Brilhante.

Há vontades que a própria moral não consegue travar. E se pensar bem... acho que foram as que me deram maior satisfação. Mas nós, homens, habituados a viver segundo normas morais, dentro de paredes, condicionados a vontades dos outros... deixamos, por vezes, as nossas vontade de lado para podermos conseguir respirar em sociedade.