segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009

fome ou, mais provavelmente, vontade de comer

digo que vêm duas coisas
dou dois focos em mim
no mesmo acontecimento
primeiro a história e suas reflexões consequentes
depois o reflexo químico
os batimentos cardíacos acelerados
as sensações de queda de serotonina
dignas de desilusão
que sempre faltam palavras

eu sou um filho que chegou em casa e não tinha o que comer
todos da casa já haviam jantado
e
que seus hábitos,
pouco condizentes com a rotina infalível da casa,
de dormir tarde acordar tarde
foram sinônimos de sumiço
ninguém sabia o que ele estava fazendo
que horas ia chegar
e não tinha nada pra comer.
pra comer!
na porta aberta geladeira vazia
se desenhavam as feições da emoção
talvez um sentimentalismo
sofrer por não ter comida...
depois todos ficavam com sono, conforme ele sentava na sala pra ver tv também
iam deslizando pelo sofá,
até que declaravam sono e levantavam.
só porque lhe davam mesada não precisava comida em casa
compra, ué
é sabido que seres humanos aguentam tranquilamente um mês sem comida
e ele sempre foi o mais saidinho
acho que não precisa tanto de nós
e comeram a comida
ou simplesmente nem lembraram que tinham o filho
comeram e,
como ele normalmente não vinha comparecendo,
esqueceram que morava mais um
e que era um filho.
depois
indo pra cama, beijinho de boa noite, cara de sosno,
disseram sentir saudade
falaram
eu saio, você tá dormindo
você chega, eu tô ficando com sono
como se assim, racionalmente,
alguma culpa se amenizasse
como se houvesse motivo
pra amor não correspondido
de um filho pros pais

então
em frente à TV
que restou ligada
vem aquela agonia no diafragma
uma pressão no globo ocular
o rosto esquenta
vontade de se encolher no sofá
e ficar sem dar respostas à mãe que talvez tenha percebido algo e retornou com a escova na boca
vem uma vontade de ganhar mais dinheiro
e ir comer lá embaixo
sempre
como viver um hotel que só garante hospedagem:
a casa dos pais?

Um comentário:

Isabella disse...

Outro dia, abri a geladeira, o congelador, na realidade, e lá, como um doce gostoso em uma embalagem rosa, um livro me encarava dentro de um saco plástico.

Lembrei disso quando li seu post.
Aliás, continuei com vontade de comer. hahaha
beijos