Se pudermos aplicar as formas que se acredita do universo ao modo como as mudanças materiais se dão ao longo do que se convencionou de 'tempo', poderia dizer que, ao mesmo tempo que é uma espiral progressiva, expansiva, é também um caminho em direção ao ápice, e do ápice ao retorno de tudo, em espiral regressiva. Seria como se se dissesse que o tempo pendula entre dois extremos, o começo e o fim ou o fim e o começo. Expansão e retração. Como se tudo sempre acontecesse uma vez e se repetisse ao contrário. A noção de decadência ou de progresso, eu diria, se obteve a partir do referencial - e de uma determinada fé. Vamos dizer que a nossa época está na direção do começo ao fim: se um sujeito hipotético acredita que no fim está o bom, dirá-se que ele é progressista, se outro sujeito hipotético acredita que o bom está no começo, ele será decadentista. São apenas dois pontos que o universo percorre, e, como não se pode saber ao certo o que era melhor, o início ou o fim, posto que não se viveu o início dos tempos nem se viverá o fim, não pelo menos nenhum dos que especularam sobre a decadência ou o progresso do tempo, não é possível dizer que alguma das duas vertentes tenha produzido a verdade essencial sobre o tema. A discussão se configurou como uma questão de fé em um determinado ponto extremo desse intervalo, que tem lá seus motivos: a forma como a modificação da matéria se impõe inexoravelmente. A expansão progressiva do universo, de acordo com o que fui ensinado, ocorre como decorrência da energia liberada pelo Big Bang, modelo semelhante ao da reação de fissão nuclear: a divisão consecutiva e subsequente de um determinado corpo em mais corpos, como acúmulos que se sucedem. Poderia ser dito que, entre os que concebem o tempo linearmente, os decadentes, como Tomás de Aquino, assim como a religião católica, vê a sobreposição inevitável desses acúmulos como algo negativo. Por uma razão que não posso deixar de tentar extrapolar do que tenho de conhecimento sobre a ideia do cristianismo: quanto mais coisas em profusão no universo, ou no mundo, mais difícil será para o ser humano, também aumentando em contingente populacional*, decodificar, desvendar, manipular, utilizar o mundo, o que torna tudo o que não é passível de percepção humana um imenso desconhecido, amedrontador, inalcançável e, portanto, prejudicial, e frustrante em seu processo cognitivo da realidade. O homem deve, pois, aceitar a grandiosidade divina, que continuará produzindo acúmulos e servir a deus e esperar a salvação, o apocalipse, onde, extrapolo, a quantidade de matéria acumulada será tamanha que o mundo não se sustentará. Em contraposição a essa ideia cristã, surgiu com o cientificismo moderno a ideia do progresso do tempo. Também me pareceu muito simples a sua lógica temporal: a linearidade e a acumulação material, combinadas a uma produção científica intensa, seriam pratos cheios para os homens crescerem e se superarem cada vez mais, invertendo a tradição cristã decadente e criando uma nova tradição cultural, que mantém traços até hoje, de perpetuação e progressão da ciência, sempre visando o bem futuro das gerações futuras. Mas, como força da inevitável acumulação material, ao longo do tempo - até o ponto em que se sucederá o retrocesso do Big Bang, se essa teoria estiver certa - as duas conecpções temporais se tornaram acúmulos humanos, presentes na mentalidade e na cultura do ocidente; assim como todas as coisas da natureza, que são uma coisa e dão origem a outra, ou permitem que várias outras se acumulem tendo como base a coisa anterior. Portanto, conforme o tempo passa e as coisas se acumulam, se acumulam também como material para o conhecimento humano, principalmente na nossa cultura, que persiste em registrar tudo, justamente para originar forçosamente novos acúmulos - na cultura católica, que não tinha fé na benefício de saber das mudanças e das formas do mundo, a possibilidade de acumular novas humanidades era quase nula, o que não gerava um cumulativismo informacional: no mundo cristão, o homem é sujeito às mazelas do cumulativismo material. O que foi possível perceber de verdade com essa nova visão linear progressista de mundo, dos modernos, foi a incapacidade humana de desmistificar toda a realidade, o que era até um projeto da mentalidade moderna - inclusive suas concepções temporais. A mentalidade moderna, com suas descobertas científicas, trouxeram sim benefícios para a humanidade, mas nada que fosse capaz de transcer-nos como deuses super-cientes. A modernidade trouxe o avanço técnico, lógico, racional, nos fazendo perceber não o mundo todo, mas justamente os limites humanos e, em decorrência deles, as formas de realização e de auto-preservação. A visão cientificista não nos trouxe a possibilidade de libertação, mas uma capacidade de operar o mundo dentro dos nossos limites, justamente o que o cristianismo não conseguiu vislumbrar, por associar, da mesma forma que os modernos, a atitude filosófica invariavelmente à atitude científica. O que percebo da contemporaneidade é a desvinculação da ciência newtoniana para fins filosóficos, de desvendamento da verdade e das formas do mundo; a ciência newtoniana nos serve de respaldo técnico para a busca do bem-estar e a filosofia que deve se encarregar de discutir sobre a verdade, as formas do mundo e o sentido da vida.
(*) Thomas Malthus
(*) Thomas Malthus
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