segunda-feira, 20 de outubro de 2008

inconscientemente

O seu fígado,
exaltava a repórter,
havia sido doado para uma menina pobre do ABC paulista,
enquanto a TV brilhava
e a morte sussurrava
toda a sua escatologia,
toda a sustentabilidade
e o valor social da reciclagem.
E os pensamentos tradicionais cristãos,
de respeito ao corpo
à integridade,
ao pós-morte,
inconscientes,
eriçavam meus pêlos,
davam frio na espinha,
faziam algo em mim estranhar esse fato
que se transmitia belo pela tal notícia,
muito embora, é claro
que também doaria.

Perdoava,
mas que se fizesse justiça,
era o que pedia a mãe da vítima.
Chorando compreensiva?
Eu entendia vingança
olho por olho, dente por dente
via bondade messiânica
que degladiava com a Babilônia Antiga.
Os dois, sentir eu também podia
e ainda criticava
depreciava
como um bom cidadão pós-copérnico
como digno herdeiro do marquês de Sade.

Aquilo
era só notícia.
Era só notícia?

moral da história:
há mandamentos tão intrínsecos
em nosso inconsciente
que são inegáveis
em nossas sensações -
mesmo que apercebidos.

Nenhum comentário: