Abriam-se as portas do vagão do metrô e eu, que ainda terminava de ler a última estrofe, acabei ficando para trás. Todos os passageiros saíam para uma mesma direção: era assim formada a fila da escada rolante, uma massa de indivíduos que arrebanhavam-se para seus fins. Todos seguiam seus caminhos e não precisavam falar; tudo em suas vidas já estava certo, sozinhos. Suas histórias, para eles, só se entrecruzavam ali, virtualmente, no metrô, nos fluxos que juntos acabariam por criar, naquele único momento em que o mundo deixava escapar essa nuance pastoril das suas vidas - fora de suas possessões, de seus apartamentos, de suas famílias, no pêndulo, como máquina, no caminho... Eu, que ficava para trás, talvez visse melhor do que ninguém. O primeiro do rebanho, por sua vez, talvez fosse o que não quisesse mais ver-se como gado e só tinha olhos para sua privacidade. Mas importante mesmo, contudo, era que todos viam sentido naquilo; e isso era-me tão opressor... Todos ali eram atores deliberados de suas vontades, ir trabalhar e retornar às posses, à paz do quarto, com mais um passo a frente no trabalho para o ócio. Todos ali rumavam para seus futuros, para suas vidas, para suas casas, para suas rotinas; e ruminavam... Era tudo tão cheio de verdade, de utilidade, era mais uma ponte tão perfeita que tudo no mundo moderno brilhava como instrumento das realizações. Nada naquilo parecia errado, ninguém podia dizer que não era livre. Ninguém queria dizer nada. Ninguém pensava em dizer nada. Ninguém queria pensar em dizer nada, porque ninguém aceitava dizer nada. Ninguém aceitava ouvir nada. Eu, lá atrás, olhando o nada. Eu, lá atrás, querendo dizer o nada. Eu, lá atrás, querendo ouvir o nada. Eu, lá atrás, cantando: "ê ô ô, vida de gado; povo marcado, ê, povo feliz"! E nada.
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Um comentário:
A questão que o texto me trouxe mora na integração do ator no rebanho e seu (duplo)compromisso para com ele. Uma vez que se esteja no rebanho, é plausível um pensar em particular à frente? É possível observar estando atrás EMBORA dentro? De onde vem o perigo? Do rebanho só se vê rebanho.Tanto o rebanho no plural como no singular. Para ver-se o nada é preciso nele estar. Viver na constante, na eterna, na onipresente aporia. Pois, aonde quer que se esteja, o horizonte limita-nos a visão.
(Desconstrução híbrida- não possuo reflexões posteriores....triste pensamento pobre...)
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