terça-feira, 19 de agosto de 2008

Não era dia

Ouviu-se o pianinho, a fumaça do cigarro não se deformava pela inexistência de qualquer janela aberta e só se via o cigarro e a mão dela - sim, uma mulher. As paredes pretas, o chão preto e somente a luz branca de um abajur modernoso. Havia também a mão do tal alguém que se sentava numa poltrona de couro preta, com aqueles tão ordinários botões que pressurizam as almofadas. Era velha, os esmaltes eram rosa e sua roupa era escura numa cor indizível - era a cor do momento todo. Ela não via nada, não fazia nada, apenas estava sentada, fumando seu cigarro, com um de seus cotovelos apoiados na poltrona, o cotovelo da mão do cigarro, que estava solta, meio desmunhecada. O outro braço acompanhava o corpo e a sua mão depositava-se próxima à sua pubis, por conforto. suas pernas cruzadas e sua roupa da tal cor era uma espécie de túnica, que ia até depois de seu joelho, mesmo sentada; suas sandálias eram jesuítas. Não fazia nada, não ventava nada e a funmaça subia retinha. Até que se desfez. A linha vertical que se formava da brasa do cigarro até o momento em que ela se misturava ao ar se desfez e vários movimentos circulares fez a fumaça e ela tragou e a brasa comeu mais um pouco do papel e seus pulmões encheu de fumaça: era possível ver seu tórax cheio. Por pouquíssimo tempo, quando soltou a fumaça num biquinho muito característico dela, voltou a mão para a posição de antes, desmunhecada sobre o cotovelo apoiado no braço da poltrona, e continuou a estar ali. Nas primeiras respirações que se seguiram à tragada expirada, resquícios de fumaça saíram pelo seu nariz. Uma ou duas vezes.

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